Gestão e prevenção para enfrentar incêndios
ONU alerta para aumento de 50% dos incêndios extremos até ao final do século.
Apostar na gestão e na prevenção é a melhor resposta para enfrentarmos a vaga de incêndios extremos que se adivinham para os próximos anos e décadas, resultado do aquecimento global que se verifica no planeta. Esta é a melhor defesa da floresta, segundo o mais recente relatório do Programa das Nações Unidas para o Ambiente (conhecido pela sigla em inglês, UNEP), que prevê um aumento de 50% dos incêndios extremos até ao final do século.
O relatório do UNEP, “Ameaça crescente de incêndios extraordinários em paisagens” – “Spreading like Wildfire: The Rising Threat of Extraordinary Landscape Fires” aconselha os governos a envolverem as comunidades locais na gestão dos fogos e a adotarem uma nova fórmula de investimento no combate ao fogo: dois terços dos gastos dedicados ao planeamento, prevenção, preparação e recuperação, e só o terço restante para o combate direto aos incêndios florestais.
Segundo o UNEP, atualmente, as respostas diretas recebem mais de metade nos gastos relativos com o risco de incêndios, enquanto o planeamento e a prevenção recebem menos de um por cento.
Uma resposta internacional
O relatório sublinha ainda a importância de a comunidade internacional, através das Nações Unidas, se envolver na gestão dos fogos, que até agora é quase da exclusiva responsabilidade dos governos nacionais. “Os incêndios florestais devem ser colocados na mesma categoria da resposta humanitária global que os grandes terramotos e inundações”, pode ler-se no estudo: de 2002 a 2016, arderam cerca de 423 milhões de hectares, uma área total equivalente à da União Europeia.
O Programa das Nações Unidas para o Ambiente (UNEP) defende que o investimento na defesa da floresta deve dedicar dois terços para planeamento, prevenção, preparação e recuperação, e o terço restante para o combate ao fogo.
“Devemos aprender a gerir melhor e mitigar o risco de incêndios florestais que ameaçam a saúde humana e os nossos meios de subsistência, a biodiversidade e o clima global”, afirmou Susan Gardner, diretora da Divisão de Ecossistemas do UNEP.
O relatório, que teve a colaboração de cerca de 50 investigadores de todo o mundo, defende a restauração de ecossistemas, como forma de mitigar o risco de incêndios florestais. Alguns exemplos dos investimentos essenciais na prevenção, passam pela restauração de zonas húmidas, a reintrodução de espécies como os castores, a recuperação de turfeiras, a manutenção da distância entre a vegetação, e a preservação de zonas tampão com espaços abertos.
Mais secas e mais incêndios
O documento da UNEP aponta como causas, para fogos florestais mais frequentes e intensos, “as mudanças climáticas causadas pela atividade humana, as mudanças no uso da terra (como a desflorestação para criar áreas de pasto ou a expansão de áreas urbanas) e a má gestão da terra e das florestas”.
Este aumento global dos incêndios extremos – estima-se de até 14% em 2030, 30% até 2050 e 50% até ao final do século– vai também passar a atingir zonas mais inesperadas, como o Ártico, além de destruir grande parte de alguns dos últimos refúgios de biodiversidade do planeta, e emitir enormes quantidades de gases poluentes para a atmosfera, facilitando o aumento das temperaturas, e originando mais secas e mais incêndios.
O exemplo português
Entre os incêndios extremos já ocorridos e analisados pelos investigadores da UNEP constam os que ocorreram em Portugal, em 2017, que consumiram cerca de 540 mil hectares no Centro e no Norte de Portugal, para além de muitas perdas humanas.
O que foi feito em Portugal após estes incêndios é “um dos melhores exemplos de abordagem e esforço de um país para apostar em melhor governança e reduzir riscos”, afirmou Peter Moore, especialista da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e investigador do laboratório colaborativo ForestWISE para Gestão Integrada da Floresta e do Fogo (da UTAD).
Os investimentos essenciais na prevenção passam pela restauração de zonas húmidas, a manutenção da distância entre a vegetação, e a preservação de zonas tampão com espaços abertos, entre outros aspetos.
“O Governo português empreendeu um processo ambicioso para desenvolver um Plano Nacional integrado de gestão de incêndios rurais”, afirmou Peter Moore ao “Expresso”, destacando o papel da Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF) e o plano aprovado para “a valorização de áreas rurais como promotoras de riqueza e sustentabilidade; a gestão ativa destas áreas com recurso a fogo controlado; a mudança de comportamentos para segurança das pessoas e preservação dos territórios; e a gestão eficiente do risco para reduzir perdas com prioridades claras e uso de recursos públicos”.
O orçamento da AGIF em 2020 dedicou à prevenção 45% dos 280 milhões de euros do Sistema Integrado de Gestão de Fogos Rurais, uma evolução face a 2017, altura em que o desequilíbrio era de 20% para 80% a favor do combate. O objetivo da instituição é chegar a 2030 com a prevenção a pesar 60% e o combate 40%.