Inteligência artificial para monitorizar a floresta
Mário Caetano, subdiretor-geral na DGT, escreve sobre as novas tecnologias usadas no Sistema de Monitorização da Ocupação do Solo.
Os territórios florestais são determinantes na definição da paisagem portuguesa e muito importantes do ponto de vista socioeconómico. É por isso essencial ter conhecimento atualizado sobre o coberto florestal e a sua evolução para variados fins, designadamente apoiar a gestão florestal ao nível do proprietário privado e apoiar a definição e acompanhamento de políticas públicas do setor florestal.
Desde há décadas que são levantados dados sobre a floresta por entidades públicas, com destaque para o Inventário Florestal Nacional (IFN) do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) e a Carta de Uso e Ocupação do Solo (COS) da Direção-Geral do Território (DGT). Em ambos os casos, os dados são obtidos por metodologias manuais e atualizados em intervalos de vários anos. Por esse motivo, mas não só, muitas empresas privadas recolhem dados mais adequados às suas atividades apesar dos custos inerentes.
A utilização das tecnologias do espaço é reconhecida como vantajosa para estudar e monitorizar as florestas devido à cobertura total do território com aquisição sistemática e frequente de dados, podendo complementar os dados mais tradicionais e mitigar a sua desatualização. Além disso, os satélites conseguem recolher dados diferenciados sobre a vegetação, como as suas propriedades espectrais, e permitem detetar alterações de forma automática e em quase tempo real. Contudo, são necessários conhecimentos técnicos avançados em áreas como a deteção remota e o processamento de imagem.
Nos últimos anos a Administração Pública Central tem desenvolvido esforços para trazer os benefícios das tecnologias do espaço para o setor florestal. No passado dia 29 de setembro cumpriu-se um ano desde o lançamento do Sistema de Monitorização da Ocupação do Solo (SMOS). O SMOS é coordenado e gerido pela Direção-Geral do Território (DGT) com a participação e envolvimento de entidades da administração pública nacional e local, do sistema científico e tecnológico nacional, do setor privado e dos cidadãos, e nasceu com o objetivo de produzir de forma contínua informação cartográfica relativa ao uso e ocupação do solo de acordo com as necessidades dos diferentes grupos de utilizadores.
O SMOS aplica algoritmos de Inteligência Artificial em imagens de satélite para produzir novos produtos cartográficos que monitorizam o território continental. Um destes produtos, a Carta de Ocupação do Solo Conjuntural (COSc), é anual e tem pixels de 10 m e 15 classes de ocupação do solo, inclusive as principais espécies florestais. A atualização anual não tem precedentes em Portugal e permite compreender melhor a evolução do território.
O SMOS oferece ainda produtos mensais que têm especial interesse para monitorizar a floresta. Os Mosaicos Sentinel-2 são composições multiespectrais de várias imagens do mesmo mês, permitindo uma visão do território sem nuvens e de onde é possível obter informação variada de uma forma simples e intuitiva. Os Mapas Intra-Anuais do Estado da Vegetação (MIAEV) são mapas que caracterizam o vigor vegetativo da vegetação através do Normalized Difference Vegetation Index (NDVI).
Todos os meses estão disponíveis três MIAEV que representam a situação atual e comparam-na com o mês anterior e com o mesmo mês de anos anteriores. Os MIAEV permitem detetar alterações recentes, como cortes florestais e fogos rurais, mas também efeitos de longo prazo sobre a vegetação como a seca.
Todos os produtos são disponibilizados como dados abertos nos visualizadores do SMOS. O visualizador mais versátil, o viSMOS, permite visualizar, explorar e analisar num browser todos os produtos de uma forma fácil e interativa, sem necessidade de conhecimentos técnicos e software especializado. Não obstante, utilizadores avançados também podem usar os produtos nos seus computadores através de serviços de visualização e descarregamento.
No futuro são esperados melhoramentos nas caraterísticas dos produtos existente e novos produtos, por exemplo com base em dados LiDAR (Light Detection And Ranging) e imagens de satélite de muito grande resolução espacial que a DGT pretende adquirir e explorar em breve. Os desenvolvimentos recentes do SMOS permitem monitorizar a floresta portuguesa como não era possível até há pouco tempo. As entidades públicas e privadas têm hoje novas ferramentas à disposição que poderão inserir nas suas rotinas de trabalho para aumentar a sua eficácia e valor. Os benefícios são múltiplos e transversais a toda a sociedade, com destaque para a gestão, ordenamento e proteção da floresta.
Artigo de opinião publicado originalmente na revista n.º 12, de dezembro de 2023, que pode descarregar aqui.